Debate realizado na OAB esclarece e analisa pontos da Reforma da Previdência

Com o objetivo de discutir os pontos da Reforma da Previdência, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Sergipe (OAB/SE), por meio das Comissões de Estudos de Direito e Economia e de Direito Previdenciário da OAB, em parceria com a Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED) e a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), realizou na noite dessa terça-feira, 23, o “Debate Reforma da Previdência – a Previdência necessária para a Democracia com Justiça Social”.

O debate contou com a participação dos professores do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe, José Roberto de Lima Andrade, presidente do Sergipe Previdência; e Christiane Senhorinha Soares Campos; e dos advogados Guilherme Teles, presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/SE, e Henri Clay Andrade, ex-presidente da OAB/SE e advogado do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e Previdência Social no Estado de Sergipe (Sindiprev).

Ao dar boas-vindas aos participantes, o presidente da OAB, Inácio Krauss, revelou que a Seccional deu inicio as discussões sobre a tão polêmica Reforma da Previdência (PEC 06/2019) com a realização desse debate técnico. Segundo Krauss, o evento envolveu não apenas os quatro debatedores convidados, mas todo o público presente.

Discussão técnica

Segundo ele, o debate foi importante porque todos esses temas que mexem com a vida do cidadão brasileiro merecem um amplo esclarecimento. “Nós tivemos um exemplo, aliás, um péssimo exemplo, de uma Reforma Trabalhista que foi votada sem qualquer discussão com a sociedade, com os trabalhadores. À época foi colocado que a reforma iria aumentar o número de empregos, e o que a gente vê hoje é o aumento do desemprego no Brasil. Então, todas essas questões têm que ser realmente discutidas com o povo”, pontuou.

Inácio Krauss enfatizou ainda que a discussão que foi feita no debate sobre a Reforma da Previdência promovido pela OAB não foi política, mas técnica. “Nossa discussão é técnica, não existe o contra ou a favor da reforma. O nosso estudo é o estudo técnico sobre a Constituição Federal. A OAB nunca fugiu do debate e sempre esteve presente nos momentos mais difíceis em que o País passou. A OAB é cobrada, mas não tem medo de cobrança e isso é que faz a nossa instituição ter independência, é isso que faz a OAB ser a última moeda no bolso da sociedade”, afirmou.

O presidente da Comissão de Estudos de Direito e Economia, José Gabriel Macedo Beltrão Filho, ressaltou o sucesso do evento. Segundo ele, o debate contou com a participação efetiva do público presente. “Foi garantida a fala para todos os participantes, os debatedores contribuíram com informações, questões técnicas e levantaram pontos polêmicos do projeto. Tivemos questionamentos de mais de 15 inscritos da plateia e todos eles trouxeram contribuição e tiveram as perguntas esclarecidas pelos debatedores”, relatou.

Missão cumprida

Conforme José Gabriel, a OAB cumpriu o objetivo de realizar o debate e inserir a sociedade sergipana nessa discussão naquela que é a casa da cidadania, da democracia que é a OAB. “A gente cumpriu o nosso objetivo, a nossa função enquanto instituição representante da sociedade civil de levar para a população sergipana esse debate tão importante, de qual Brasil nós devemos construir tanto para o presente quanto para o futuro. E no dia 13 de maio já tem confirmada uma audiência pública para ser realizada na sede da Caixa de Assistência dos Advogados de Sergipe (CAASE)”, disse.

O presidente da Comissão de Direito Previdenciário, Guilherme Silva Teles Costa destacou que o debate sobre a Reforma da Previdência (PEC 06/2019) foi muito relevante do ponto de vista técnico com a participação de advogados, economistas e integrantes de toda a sociedade.

“Foi possível apresentar, em nome da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/SE, os principais pontos da Reforma com os seus prováveis impactos nos mais diversos benefícios previdenciários. Ao mesmo tempo, parabenizo a Comissão de Estudos de Direito e Economia pela organização do debate, pautado nos princípios democráticos, abrindo espaço para as manifestações de todos os presentes”, afirmou.

O debate

Durante o debate, a professora do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe, Christiane Senhorinha Soares Campos, explicou a preocupação de que se possa debater a questão previdenciária no âmbito do desenvolvimento econômico. Segundo a professora, normalmente a justificativa para a reforma é a de que o Estado gasta muito, no entanto, pouco se tem debatido sobre a condição da economia de ter um baixo desenvolvimento econômico. “A gente tem uma economia cada vez com menos atividades, com cada vez mais pessoas desempregadas e isso impacta na Previdência, porque quanto menos gente empregada menos contribuição você tem para a Previdência”, explicou.

Conforme Christiane Campos, ao invés de discutir o que tem feito à economia do País ficar estagnada e o que é possível fazer para movimenta-la, o Governo só fala em cortar gastos. “A gente sabe do ponto de vista da teoria econômica que o que faz aumentar o investimento no País não é as contas estarem equilibradas, mas a perspectiva de ganhos, empresários investem quando tem perspectivas de ganhos, então se não houver estímulo a atividade econômica não vai adiantar cortar agora porque daqui a pouco a gente vai ter que reformar de novo, porque de novo vai estar com problemas nas contas previdenciárias”, argumentou.

Segundo a professora, discutir a questão previdenciária sem discutir o desenvolvimento econômico já é uma preocupação grande. Outro aspecto importante lembrado por ela foi o de que o Governo fala muito em cortar despesas como se isso não afetasse a economia. “Numa economia como a nossa, os gastos do Governo correspondem a 20% do Produto Interno Bruto (PIB), se o Governo corta esse gasto significa menos atividade econômica. O Governo é um grande comprador, um grande fornecedor de bens e serviços, então isso tem um impacto socioeconômico gigantesco na economia e isso também não é levado em conta, então se faz o discurso como se Governo tivesse que se comportar como uma família e ter receitas iguais as despesas, no entanto qual é a família que pode aumentar a carga tributária, reduzir carga tributária, estimular a atividade econômica , nenhum de nós pode fazer isso, a gente sim tem que equilibrar as contas. Os gastos do Governo têm um efeito multiplicador, cada vez que o Governo gasta ele estimula outras atividades econômicas e boa parte dos gastos do Governo voltam para ele em forma de impostos, então não se pode exigir que o Governo tenha o mesmo comportamento que as famílias. Isso é uma falácia, fazer esse tipo de discurso é enganar a população”, enfatizou.

Christiane Campos disse também que a Reforma da Previdência proposta penaliza a população que já ganha pouco, que já tem uma renda salarial pequena e essa população já paga bastante para ter acesso a Previdência. “O que está sendo proposto irá penalizar ainda mais essa população seja com elevação de alíquotas seja com o aumento da idade mínima para aposentar, particularmente as mulheres serão bastante penalizadas com a medida proposta e o discurso é de que isso é para cortar privilégios, e, no entanto, o que está sendo proposto para a reforma dos militares mantém os privilégios. O que se está propondo é um retrocesso, é o desmonte do sistema de seguridade ao propor um sistema previdenciário que acaba com o princípio da solidariedade, da repartição e propõe um sistema de capitalização que ninguém sabe direito as regras porque tudo será decidido por lei complementar depois, e a sociedade não vai participar desse debate”, comentou.

O professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe e presidente do Sergipe Previdência, José Roberto de Lima Andrade, destacou os dados da Previdência Estadual, gerido pelo Sergipe Previdência. De acordo com José Roberto, o Estado de Sergipe tem um regime próprio e um modelo de repartição que tende hoje a perder a sua razão de existir, porque no modelo repartição são os ativos que pagam os inativos. “Há 10 anos nós tínhamos dois servidores ativos para m servidor inativo , hoje nós temos 0,95, isto é, nós temos mais servidor inativo do que ativo, e esse número tende a cair ainda mais por causa da velocidade de concessão de aposentadorias é muito maior do que a velocidade de entrada de servidor. Acho que é uma discussão importante e que a gente á deveria ter tido há 10, 20 anos e espero que a gente consiga num debate democrático discutir o problema e encontrar soluções para que a gente possa ter uma sustentabilidade da Previdência, uma Previdência mais racional e menos explosiva do que a gente tem hoje”, avaliou.

O ex-presidente da OAB/SE e advogado do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Henri Clay Andrade disse que a Reforma da Previdência está em pauta por conta de uma política. Segundo Henri Clay, a questão não é só técnica. “Os tecnocratas escrevem o modelo, mas quem define a política são os políticos, e a Reforma da Previdência é um modelo político de Estado, assim como a Reforma Trabalhista é uma política de Estado, assim como a PEC que se transformou em emenda constitucional do congelamento e investimentos sociais é uma política de Estado, que faz parte da mesma política, embora nós tenhamos trocado os Governos. A Reforma Trabalhista e a PEC que se transformou em emenda constitucional são do Governo Temer e a Reforma da Previdência do atual Governo Bolsonaro, mas a política macroeconômica é a mesma, uma visão de Estado mínimo dos que acreditam, defendem e querem projetar o Brasil com um modelo de Estado liberal”, pontuou.

De acordo com Henri Clay, a proposta da Reforma da Previdência (PEC06 /2019) que está em pauta é a mais radical até hoje vista no Brasil. Segundo ele, é mais do que uma reforma, se trata de uma nova Previdência. “E porque é a mais radical, porque essa proposta visa uma ruptura constitucional sem precedentes”, ressalta.

No seu discurso Henri Clay também falou sobre o déficit previdenciário. Ele questionou qual o déficit e se esse déficit é na Previdência ou não. “Há controvérsias a esse respeito. O Governo diz que sim, mas associações, inclusive a Associação Nacional dos Auditores Fiscais diz que não”, afirmou.