Comissão de Direito Digital, Inovação e Tecnologia fala sobre uso de internet em tempos de pandemia

A Comissão de Direito Digital, Inovação e Tecnologia da Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe (OAB/SE) ressalta a importância da atuação da advocacia e o uso saudável, produtivo e seguro da internet em tempos de pandemia.

A presidente da Comissão, Milla Cerqueira Fonseca, e o vice-presidente da Comissão, Carlos Correia Júnior, revelam que as ferramentas utilizadas para atendimento online de clientes; a garantia do acesso seguro a aplicativos e programas; a administração da vida pessoal e da atuação profissional; os cuidados acerca da captação indevida de clientela, entre outros assuntos são fundamentais e requerem domínio e conhecimento por parte dos advogados e advogadas.

Os dois representantes da Comissão da OAB/SE selecionaram algumas importantes dicas sobre Direito Digital que podem esclarecer dúvidas de quem ainda está iniciando nesta seara e de quem deseja aprofundar o entendimento sobre a temática.

Confira:

Programas ou aplicativos que a advocacia pode utilizar para o atendimento à clientela neste período de pandemia da Covid-19.

Carlos Correia Jr: Há no mercado diversas ferramentas que podem auxiliar os escritórios de advocacia a manter suas atividades em pleno funcionamento, tanto no aspecto de gestão e comunicação entre a equipe de trabalho, como também no atendimento ao cliente. Assim, o trabalho home office pode ser viabilizado pela utilização de e-mails, aplicativos de mensagens de texto, áudio, e que possibilitam chamadas de áudio e vídeo, como por exemplo, o WhatsApp e Telegram, os quais permitem você manter contato com seus clientes. Caso o advogado atue na área corporativa, necessitando realizar reuniões com mais de uma pessoa ao mesmo tempo, ele também pode se utilizar de aplicativos e plataformas digitais que possibilitam a realização de videoconferência para reuniões em grupo, como por exemplo, o Zoom, Hangouts, Skype, Microsoft Teams, etc. Por fim, cabe frisar que as ferramentas de assinaturas digitais e eletrônicas, possibilitam a assinatura de procurações e contratos, tornando ainda mais viável os atendimentos e negociações virtuais.

Vantagens e desafios dos atendimentos virtuais.

Milla Cerqueira: Os atendimentos online sempre funcionaram bem, no entanto, havia uma barreira cultural enorme sobre essa forma de comunicar. A pandemia forçou a todos nós uma adequação praticamente imediata, e com isso, áreas primordiais em nossa sociedade, como o Direito e a Medicina, precisaram adequar-se em tempo recorde. Um ótimo exemplo é a força e proporções antes inimagináveis que a telemedicina ganhou, com a situação de pandemia atual, todos os questionamentos que outrora frearam o avanço dessa nova forma de atendimento (algumas das travas eram legislativas), foram deixados de lado pela necessidade atual da sociedade, de forma semelhante ocorreu na advocacia. O resultado disso foram surpresas positivas e avanços inovadores para diversos setores da nossa economia.

Carlos Correia Jr: Com a criação de aplicativos e plataformas digitais de comunicação, os atendimentos virtuais passaram a ser um verdadeiro plus na carreira da advocacia, eis que com a possibilidade de compartilhamento de mensagens de texto, áudio, vídeo, arquivos, chamada de voz e vídeo, tudo em tempo real e por meio de uma única ferramenta, possibilitou os advogados alavancarem suas carreiras, uma vez que quebrou as barreiras geográficas, fez com que economizasse mais tempo, inclusive, havendo a possibilidade de ter um escritório home office, pois as plataformas funcionam perfeitamente. Acontece que havia uma resistência por parte não somente dos advogados, mas dos clientes também, principalmente por se tratar a advocacia de uma profissão bastante tradicional, porém, com a chegada da pandemia causada pela Covid-19, o isolamento social se fez necessário, fazendo com que diante das necessidades e circunstâncias atuais, toda sociedade acelerasse a sua mudança cultural, habituando-se ainda mais com as ferramentas tecnológicas. Desse modo, a experiência com os atendimentos virtuais sempre foi satisfatória, ficando ainda mais nos tempos atuais de isolamento social, inclusive, diversas outras profissões como a Medicina, Psicologia, etc, adotaram o atendimento telepresencial como uma alternativa de dar continuidade aos seus serviços durante o período de pandemia que estamos enfrentando.

Como realizar o atendimento nos casos de a clientela não possuir acesso ou não ter um bom sinal de internet?

Milla Cerqueira: O Brasil é um país de extrema desigualdade, uma pesquisa realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC), referentes a informações do ano de 2018, mostra que cerca de 46,5 milhões de domicílios têm acesso a internet no Brasil, ou seja, 67% de todas as casas no país têm acesso à rede. A realidade é que nem todos esses 67% tem internet de alta velocidade, é uma ferramenta cuja distribuição deve chegar a todos no médio longo prazo, através das empresas de telefonia e da implementação do 5G no país. Para os mais curiosos, recentemente o colega advogado Ronaldo Lemos escreveu para o Jornal Folha de São Paulo um artigo intitulado “Escola home office não deu certo”, no artigo ele destaca as razões deste fiasco e uma delas é justamente a falta de boa conexão na casa de grande parte dos brasileiros, principalmente os de classe econômica social menos favorecidos.

Carlos Correia Jr: Nesse caso, uma alternativa para continuidade dos serviços, evitando o contado social em observância às normas sanitárias de combate à Covid-19, seria o atendimento por ligação e o envio de documentos por meio de motoboy, assim, haveria a comunicação com o cliente e entrega de documentos, sem que houvesse aglomeração no escritório.

Importância da utilização de programas e aplicativos seguros.

Carlos Correia Jr: É importante utilizar sistemas operacionais e softwares originais e atualizados, evitando a utilização de versões pirateadas. Também é essencial ter um antivírus instalado no dispositivo eletrônico e mantê-lo atualizado, sendo que existem versões gratuitas, mas quem puder adquirir uma versão paga mais completa é sempre recomendado, inclusive, as assinaturas anuais não costumam ser muito caras, além de poderem ser parceladas no cartão de crédito. Também é imprescindível que o usuário se conecte apenas com redes seguras, e caso seja possível, criar uma rede privada virtual (VPN) para garantir a criptografia na troca de informações no escritório. Uma dica importante para manter os arquivos e dados do escritório protegido contra qualquer imprevisto, é manter a rotina periódica de backups. Por fim, também é sempre fundamental a utilização de senhas fortes para as constas de e-mail, sistema de nuvem, dentre outras contas que o usuário possuir no ambiente digital.

Uso da tecnologia nesse novo cenário.

Milla Cerqueira: Vou parafrasear uma grande empresária do varejo nacional, Luiza Trajano, ela afirma que evoluímos 20 anos em poucos meses. Eu penso que isso aconteceu da forma bastante dramática, pois em que pese esse avanço tecnológico seja excelente e necessário para toda a sociedade, estamos atravessando períodos obscuros na economia (desemprego, falência de diversos setores) e na saúde (ansiedade, depressão e violência contra a mulher). Estamos verdadeiramente aprendendo e evoluindo na dor, portanto, é tempo de abusar da criatividade e soluções ágeis, mas sem esquecer da humanidade.

Carlos Correia Jr: O atual cenário que estamos vivendo fez com que toda a sociedade evoluísse em poucos meses, o que duraria em anos, dada a necessidade da sociedade se adaptar de uma vez por todas à tecnologia, bem como reestruturar toda uma cultura social. Hoje as pessoas buscam entender mais sobre segurança da informação e as normas jurídicas aplicadas ao ambiente digital, em razão do atual contexto de transformação social vivido, aumentando-se as relações jurídicas por meio digital, como por exemplo: negociações, comércio, crimes, etc.

Administração do tempo de trabalho home Office. O que pode favorecer uma atuação produtiva?

Milla Cerqueira: Eu penso que a rotina é melhor forma de alavancar a produtividade, é um grande desafio construí-la em tempos tão incertos, mas é necessário. Sugiro que todos abusem das agendas (de papel ou virtuais), cadernos chamados de planners ou moleskinis, essas ferramentas costumam entregar um senso de organização e essa é a base para nos mantermos produtivos.

Carlos Correia Jr: A rotina do trabalho em home office exige bastante disciplina, foco e planejamento. É extremamente necessário que seja organizada previamente uma lista das tarefas para serem executadas, bem como evitar distrações como televisão e celular durante o horário de trabalho. Sabe-se que há uma maior dificuldade para se concentrar no trabalho quando se está em casa, principalmente para quem não estava habituado com uma rotina de trabalho em home office. Assim, é interessante a realização de meditação, deixar o ambiente de trabalho organizado, e caso seja necessário, a fim de evitar distrações por conta de eventuais barulhos, utilizar-se de fones de ouvido com músicas relaxantes emissoras de ondas alpha. Por fim, cabe ressaltar a prática da técnica Pomodoro, que consiste na utilização de um cronômetro para dividir o trabalho em períodos de 25 minutos ininterruptos de extremo foco no trabalho desempenhado, com breves intervalos de 5 minutos.

Cuidados que se devem ter em relação à captação indevida de clientela na internet. Práticas que são indevidas e que são liberadas pelo Código de Ética e Disciplina da OAB?

Milla Cerqueira: Atualmente existem dois modelos de publicidade no mundo: o Francês e o Inglês, este último é também adotado pelo mercado americano. Não é incomum ver nas ruas dos Estados Unidos carros plotados com o número de celular do profissional, incluindo a sua área de atuação, o modelo Francês, por sua vez, veda qualquer tipo de propaganda explícita. Até certo ponto, a proibição da propaganda protegeu os profissionais brasileiros de atitudes puramente mercantilistas, no entanto, com a mudança na forma de comunicação das pessoas e com a maçante utilização dos smartphones, permitir que o advogado fique de fora desta tendência de mercado, baseado em uma legislação de 20 anos atrás, pode ser perigoso para os resultados desta classe. Recentemente a OAB divulgou que pretende reformular as regras que tratam de publicidade e propaganda, com o objetivo de permitir anúncios nas redes sociais e outros tipos de propaganda, esta proposta tem previsão de ser votada até o segundo semestre deste ano. Ou seja, um verdadeiro avanço para a classe de advogados, pois o provimento 94 do ano 2000 traz, claramente, conceitos ultrapassados. Hoje toda e qualquer exposição dos juristas deve obter caráter meramente informativo e não visar captação de clientela, por esse motivo que o marketing de conteúdo foi e é bastante utilizado pela advocacia.

Carlos Correia Jr: Em tese, o Código de Ética e Disciplina da OAB veda apenas a captação direta de clientela, em que o advogado oferece diretamente seus serviços ao cliente de forma mercantilizada. Contudo, o mais recomendado ao advogado é que busque visibilidade e construir uma autoridade em sua área de atuação por meio do chamado marketing de conteúdo, ou seja, por meio de artigos escritos em blogs, posts e vídeos nas redes sociais, em que o advogado expõe apenas de forma educativa um determinado conteúdo, sem que se insinue ou ofereça seus serviços. Ressalta-se que no tocante às redes sociais, diversas seccionais, inclusive, a seccional de Sergipe, vedam o impulsionamento/patrocínio de publicações.

Uso pessoal da internet: dicas para uma utilização saudável exemplos de práticas ou aplicativos que possam ser benéficos.

Carlos Correia Jr: Nesse período de isolamento social, a fim de evitar o pânico e o estresse, o entretenimento e diversão são extremamente importantes e saudáveis para se ter uma boa qualidade de vida. Assim, devem-se aproveitar as oportunidades que o mundo digital oferece, permitindo, por exemplo, que você adquira um e-book (livro digital), que com apenas um clique pode ter um livro inteiro em suas mãos, inclusive, existem diversos e-books gratuitos no mercado. Por meio de aplicativos, você pode utilizar esses livros digitais da mesma forma que um livro físico, fazendo marcações de textos, adicionando comentários e marcando páginas. Também há plataformas digitais que possibilitam entretenimento, como as redes sociais: Instagram, Facebook, TicTok, etc., assistir filmes, séries, documentários e entretenimento de modo geral, como: Netflix, YouTube, Amazon Prime etc., ou até mesmo ouvir músicas: Spotify, Deezer, YouTube Music etc. Portanto, durante esse período de isolamento social, as pessoas devem se atualizar e aproveitar ao máximo o tempo livre e de trabalho remoto para explorar as ferramentas que o mundo digital e tecnológico nos oferece.

Sobre os representantes da Comissão de Direito Digital

Milla Cerqueira é advogada, autora de dois livros sobre proteção de dados e incentivadora da inovação no setor jurídico. É também vice-diretora da Associação dos Advogados de São Paulo (ABA-SP); integrante da Comissão Especial de Startups; e membro conselheira da Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB, em Brasília.

Carlos Correia Júnior é advogado; pós-graduado em Direito Digital e Compliance; pós-graduado em Master in Business em Direito do Trabalho e Previdenciário; pós-graduando em Direito Empresarial; e pós-graduando em Advocacia Extrajudicial. Possui Nanograduação em Lei Geral de Proteção de Dados e é também membro do Legal Hackers Capítulo de Aracaju.