Webnário Tereza de Benguela: mês da advocacia em Sergipe é iniciado com evento significativo

A programação da Ordem dos Advogados do Brasil para agosto, mês da advocacia, foi iniciada nesta segunda-feira, 3, com o Webnário Tereza de Benguela. O evento ocorre até hoje, 4, com voz, participação e representatividade de mulheres pretas.

Em dois dias de realização, o webnário conta com explanações de gestoras públicas pretas e é idealizado pela OAB/SE através das comissões de Igualdade Racial; de Liberdade Religiosa; de Defesa dos Direitos da Mulher; e da Verdade sobre a Escravidão Negra em Sergipe.

Responsável por realizar a abertura do evento, a vice-presidente da OAB/SE, Ana Lúcia Aguiar, enalteceu a magnitude do webnário. “O reconhecimento da luta por igualdade perpassa pela batalha de grandes mulheres que há séculos já tinham a voz da resistência, como Tereza”.

“Esse webnário reflete sobre diversos exemplos de força e determinação e isso é um motivo de grande orgulho. A justiça não foi feita em sua completude. Ainda há muito o que reparar. Mas não basta só lutar pela sororidade. É preciso buscar, sobretudo, a igualdade”, abalizou.

Racismo estrutural

Na ocasião, o presidente da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra em Sergipe, Ilzver Matos, ressaltou a participação das expositoras. “São mulheres que aceitaram esse desafio de falar sobre tantos anos de experiência na gestão pública, sendo verdadeiras referências”.

A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da OAB, Adélia Moreira Pessoa, parabenizou a entidade pela realização do webnário, “que traz uma discussão tão necessária sobre o racismo estrutural”. Ela afirmou ainda a necessidade de aprofundar mais os debates.

“É preciso aprofundar cada vez mais as discussões e pesquisas para identificar em que medida a dificuldade na efetivação dos direitos das mulheres negras relaciona-se com a sub-representação dessas pessoas nos espaços políticos, institucionais e de gestão”, disse.

Explanações

O primeiro dia de evento contou com uma roda de conversa que colocou em discussão o tema “Mulheres negras, política e gestão pública”. Foram 6 expositoras: Maria do Socorro Guterres; Lucy Góes; Zelma Madeira; Elza Neves Lopes; Sandra Sena e Goreth da Silva Pinto.

Maria do Socorro é secretária-adjunta da Igualdade Racial do Maranhão; Elza Neves é ex-secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Rio Branco; Sandra Sena é secretária municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial de Laranjeiras.

Zelma Madeira é coordenadora de Políticas Públicas para Promoção da Igualdade Racial do Ceará; Lucy Góes, coordenadora executiva de Promoção da Igualdade Racial da Bahia; e Goreth da Silva, coordenadora do Núcleo Estadual de Promoção da Igualdade Racial do Acre.

A bacharel em Direito, Tayane Rocha, foi a moderadora da roda de conversa. Na oportunidade, Tayane destacou a presença ilustre das palestrantes e dos organizadores do webnário.

Desafios

A coordenadora executiva de Promoção da Igualdade Racial da Bahia, Lucy Góes, ressaltou em sua explanação a experiência da Gestão da Política de Promoção da Igualdade Racial nas esferas municipal, estadual e federal.

Ela também falou sobre os desafios apresentados, o combate ao racismo institucional, às estratégias utilizadas para superação destes desafios, e em relação às perspectivas com a política diante do cenário que ora se apresenta.

De acordo com Lucy Góes, um dos desafios está relacionado à mudança de perspectiva no processo de desenvolvimento das políticas intersetoriais. “Pensamos em uma política pública antirracista, com diálogos constantes, ações afirmativas, participação política e apoio as ações de controle social. São ações que têm como foco o enfrentamento a esses desafios”, afirmou.

Políticas públicas

A secretária-adjunta da Igualdade Racial do Maranhão, Maria do Socorro, fez uma abordagem sobre as políticas públicas de promoção de igualdade racial no Governo do Estado com o foco mais específico para as mulheres negras rurais, que são as mulheres de comunidades Quilombolas.

“Desde o início do Governo Flávio Dino, através da Secretaria de Igualdade Racial juntamente com outros parceiros nós temos implementado várias ações. O Programa Maranhão Quilombola tem cinco eixos, a exemplo dos eixos de inclusão produtiva e de saúde voltados para as mulheres negras. Além disso, nesse programa temos uma ação estratégica denominada Caravana Maranhão Quilombola, que atende mulheres quilombolas nas suas comunidades e também temos a política de saúde integral da população negra”, ressaltou.

A secretária municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial de Laranjeiras, Sandra Sena, explanou sobre os desafios e as políticas afirmativas implementadas pela pasta. Conforme a secretária, Projetos de Lei foram aprovados no Município durante a sua gestão.

Projetos

“Projetos que mudam a vida das pessoas. As perspectivas diante do cenário nacional e a batalha diante da Pandemia, para conter o avanço nas comunidades Tradicionais”, ressaltou.

Entre os projetos desenvolvidos ela citou o Projeto Yepada – palavra em Yorubá que significa transformação -, com mulheres Quilombolas, marisqueiras, através da Gastronomia. Sandra Sena explicou que nesta iniciativa as mulheres participaram de diversos cursos de formação em instituições como SENAC, SEBRAE e UFS para manipulação de alimentos, atividades afroempreendedoras e precificação de alimentos.

“Elas utilizam 90% de seus insumos através da própria comunidade, com horta comunitária, das marisqueiras e pescadores”, afirmou.

A secretária Sandra Sena destacou ainda o Projeto Sementes do Quilombo, de horta comunitária, realizado em parceria com a Votorantim Cimentos e a Embrapa. “Não precisamos dar o peixe, mas a vara e ensinar a pescar. Isso é o que o gestor precisa fazer com Comunidades Tradicionais”, enfatizou.

Obstáculos

A coordenadora de Políticas Públicas para Promoção da Igualdade Racial do Ceará, Zelma Madeira, falou do trabalho e desafio que vem tendo a frente da Coordenadoria para a efetivação de uma política de igualdade racial no Brasil e no Ceará.

Zelma também destacou o que vem sendo feito pela Coordenadoria , que tipo de ação vem sendo implementada e quais os aspectos facilitadores e obstáculos para implementar a política de igualdade racial no território do Ceará.

“Acredito que um dos grandes obstáculos para a implementação das políticas é a questão racial não ter tomado a dimensão que ela tem numa sociedade de quase 400 anos de escravidão. A questão racial tem sido desprezada pela grande mídia, por quem tem poder de decisão, pelos economistas, pelos juristas, pela universidade, que é o lugar da construção do conhecimento. Nós não temos sequer unanimidade de que somos racistas, numa sociedade racialista que define o lugar de homens e mulheres a partir da pertença racial, e isso tudo vai gerando uma forma sofisticada de racismo estrutural”, comentou.

De acordo com Zelma Madeira, o racismo estrutural está presente e tem se colocado como obstáculo da forma como naturaliza as desigualdades raciais. “A gente não vai se assustando em encontrar determinados lugares que só tem uma visão monocromática, como por exemplo, juízos e magistrados, onde nós temos uma presença muito grande só de brancos, mas isso não nos incomoda pela força e obra do racismo estrutural que naturaliza as hierarquias raciais”, salientou.

Enfrentamento ao racismo

“No Ceará nós temos uma força discursiva de que não tem negro e não tem negra, então esse é um discurso ideológico que também se coloca como dificuldade. A própria política de igualdade racial é muito nova no nosso país e acanhada em termos de orçamento e recursos e são coisas que têm limitado a pauta de uma política de igualdade racial que ainda ocupa os subterrâneos das políticas públicas do país”, afirmou.

A coordenadora do Núcleo Estadual de Promoção da Igualdade Racial do Acre, Goreth da Silva, destacou em sua fala que a política de igualdade racial foi inserida no Estado a partir de 2011 dentro da estrutura da Secretaria Estadual de Direitos Humanos.

Segundo ela, o Núcleo além das questões de igualdade racial trabalha também a diversidade sexual e intolerância religiosa. “Mesmo com todas as dificuldades financeiras nós conseguimos fazer uma campanha de sensibilização em todos os 22 municípios do Acre. A nossa intenção era formar os órgãos gestores, como os fóruns de educação”, disse.

Conforme Goreth, mesmo trabalhando com recursos federais e em parceria com outras entidades foram construídas políticas nos municípios. “Paralelo a isso nós também desenvolvemos algumas ações na capital do Estado, a exemplo da roda de conversas realizada na Assembleia Legislativa, da formação de gestores e da Quinzena da Mulher Negra”, revelou.

A ex-secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Rio Branco, Elza Neves, falou sobre a sua experiência à frente da pasta e as principais ações de enfrentamento ao racismo desenvolvidas no período de 2015 a dezembro 2019.

Segundo ela, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Rio Branco foi criada em 2013. Na sua gestão, entre as ações que foram desenvolvidas estavam à execução do Projeto de Enfrentamento ao Racismo Institucional, a execução do projeto de mapeamento da Juventude Negra, a construção do Plano Municipal de Enfrentamento ao Racismo, a realização da oitava edição da Quinzena da Mulher Negra e do Fanegras em 2015, 2016 e 2017, um festival com diversas ações culturais da população negra.