OAB/SE publica moção de apoio à carta aberta do Fórum Nacional de Instâncias e Mulheres de Partidos Políticos

A Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, através da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, publica nesta quinta-feira, 03, a moção de apoio – aprovada pelo Conselho Seccional – à carta aberta do Fórum Nacional de Instâncias e Mulheres de Partidos Políticos, que trata de desafios e estratégias para mudança da sub-representação das mulheres no universo político.

A carta também repudia Projetos de Lei que tramitam no Congresso Nacional e tentam retirar a garantia de participação de no mínimo 30% de mulheres nas nominatas de candidaturas nos partidos políticos para as próximas eleições. Confira a moção de apoio da OAB/SE:

“A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da OAB/SE, reunida ordinariamente em 03/09/2019, aprovou por unanimidade moção de apoio à Carta aberta do Fórum Nacional de Instâncias e Mulheres de Partidos Políticos (FNInMPP) que trata dos desafios e estratégias para a transformação da sub-representação das mulheres no universo político, e especificamente repudia projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional, que tentam retirar a garantia de participação de no mínimo 30% de mulheres nas nominatas de candidaturas nos partidos políticos para as próximas eleições.

O Brasil ocupa o vergonhoso último lugar no ranking do continente americano de participação política de mulheres, o que demonstra que apesar dos avanços é preciso promover novas ações e, sobretudo impedir retrocessos. Reduzir essa desigualdade é condição sinequa non para o aperfeiçoamento do nosso sistema democrático, para alcançar um sistema político mais representativo e fiel aos grupos sociais existentes.

Não é de hoje que a Lei Brasileira tem avançado para assegurar a participação feminina na política tendo em mira o amadurecimento da democracia brasileira. Isso porque não se pode pensar num Estado Democrático de Direito que permaneça privilegiando um gênero em detrimento dos demais, sobretudo em prejuízo daquelas que são a maioria da população e do eleitorado.

Os partidos políticos devem promover a democracia em suas organizações sob pena de não o fazendo se sujeitarem ao controle estatal, que deve por sua vez, promover a harmonia entre os partidos e os mandamentos constitucionais, dentre eles o do regime democrático.

É nesse contexto que surgiram as ações afirmativas. Elas possuem como objetivo principal materializar a igualdade formalmente descrita na Lei Maior. As cotas de gênero na política são, portanto, fruto de um mandamento Constitucional. São instrumento para a efetivação da tão sonhada igualdade.Elas surgiram no sistema eleitoral brasileiro por meio da Lei 9.100/95, que determinava, no âmbito das eleições proporcionais, o percentual mínimo de 20% de candidaturas femininas para cada partido ou coligação. Durante a vigência da Lei, atualmente já revogada, o entendimento do TSE era de que a aplicação da norma não possuía natureza obrigatória, e por óbvio, não previa punição para quem a descumprisse.

A Lei 9.504/97 (Lei das Eleições), por sua vez, alterou o percentual, ampliando para 30% a percentagem mínima de reserva de vagas para um dos sexos. Contudo, o entendimento dos Tribunais Superiores ainda permanecia no sentido de que a obrigação era apenas a de reservar as vagas, sem gerar responsabilização para os partidos ou coligações que não conseguissem cumprir a cota de candidaturas femininas.

A política brasileira, fruto do mesmo processo patriarcal e machista que atinge todos os espaços de representação do nosso país, pouco avançava na prática, inobstante as alterações legislativas realizadas até então. O cenário passou a apresentar mudança mais significativa a partir da edição da Lei nº. 12.034/09, que alterou o §3° do art. 10 da Lei 9.504/97, modificando no texto a expressão “deverá reservar” por “preencherá”.

A partir daí foi assegurado o caráter imperativo da norma, considerada pelos Tribunais, de eficácia imediata. O TSE entende que, em regra, a lista de registro apresentada por partido político ou coligação que não observar o percentual estabelecido pelo §3° do art. 10 deverá sofrer adequação, seja para o acréscimo de novas candidaturas do sexo que ainda não atingiu o percentual mínimo, para a substituição de candidaturas ou até para a exclusão de candidaturas a fim de que se atinja a regra do percentual mínimo para um dos sexos.

Foi a mesma norma que determinou no inciso V do artigo 44 da Lei 9096/95, o investimento de no mínimo 5% do Fundo Partidário para a criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres. Num sistema político dominado por homens, as ações afirmativas representam alternativa legal e eficaz para o aumento da participação da mulher nos espaços de poder e decisão. Principalmente em função do caráter obrigatório – senão somente em função dele – as agremiações partidárias têm ao longo dos anos sentido a necessidade de se adequar, de promover políticas de incentivo à participação da mulher em suas organizações.

Mais recentemente, a Lei nº 13.165/2015 trouxe expressivas mudanças em prol do fomento da participação da mulher na política, mormente no que se refere à aplicação do Fundo Partidário. Aduz o novo inciso V do artigo 44 da Lei 9096/95 que os recursos do Fundo Partidário serão aplicados “na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, criados e mantidos pela secretaria da mulher do respectivo partido político ou, inexistindo a secretaria, pelo instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política de que trata o inciso IV, conforme percentual que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 5% do total”.

Além disso, a chamada minirreforma de 2015 incluiu um parágrafo 7º no mesmo artigo 44, permitindo a acumulação dos recursos do fundo partidário em diferentes exercícios financeiros, desde que mantidos em contas bancárias específicas, para utilização em campanhas eleitorais de mulheres. Mas não é só, o artigo 9º da Lei 13.165/2015 também determinouque as agremiações reservassem, em contas bancárias específicas, no mínimo 5% e no máximo 15% dos recursos do Fundo Partidário para aplicação nas campanhas das candidatas.

É certo que um dos maiores obstáculos enfrentados pelas mulheres quando se fala em participação na política é a falta de apoio e por consequência, a falta de recursos para a promoção de suas campanhas. A Lei, agora de maneira mais clara e imperativa, obriga os partidos a financiarem candidaturas femininas. De igual modo, entendeu o TSE que o percentual mínimo de 30% de candidaturas deveria ser seguido da aplicação de também o mínimo de 30% do recente Fundo Eleitoral. Um dos grandes desafios tem sido garantir o cumprimento do que a Lei apregoa.  E em razão disso, os direitos arduamente conquistados tem sido alvo de pressão política, ataques midiáticos, além de ameaças de retrocesso por meio de proposituras de PLs como os de nº 2996/2019 e 4130/2019 que visam retirar a obrigatoriedade das reservas de vagas de candidaturas.

Ao invés de se dialogar a respeito dos caminhos para o cumprimento efetivo da lei, para o fortalecimento da participação das mulheres na política e punição dos que utilizam as mulheres como candidatas laranja, tenta-se, na contramão do caminhar evolutivo da democracia, retirar direitos arduamente conquistados para o avanço da participação política da mulher. A participação da mulher na política não pode ser encarada como retrocesso da participação do homem, mas como sinônimo de desenvolvimento da democracia e aperfeiçoamento do sistema político.

Tampouco se pode permitir a disseminação equivocada de que as mulheres já avançaram o suficiente. Quantas vezes você já ouviu: – Vocês já trabalham fora, já tem os mesmos direitos! – ? Ouve-se isso tão constantemente quanto se associa as mulheres às figuras dos parceiros, se reduz as militantes e/ou candidatas à condição de esposa de fulano. É pratica comum das agremiações partidárias, mesmo das mais progressistas, a busca por candidaturas femininas apenas para o cumprimento das cotas obrigatórias, sem o apoio necessário para efetivamente eleger candidatas.

Há ainda muito a caminhar até que a participação da mulher na política seja naturalizada e supere as amarras de séculos de exclusão e subalternidade. Talvez somente com mudanças mais incisivas, como as cotas em cadeiras do legislativo (e não somente em candidaturas), o sistema fosse capaz de alcançar resultados mais expressivos e imediatos no combate à sub-representação da mulher na política.

Em razão do exposto, a CDDM OAB/SE se alinha ao Fórum Nacional de Instâncias e Mulheres de Partidos Políticos, e conclama o Conselho Seccional da OAB/SE a juntar-se à luta contra toda ameaça de retrocesso na participação da mulher na política.”