OAB/SE capacita advocacia para assistência jurídica à mulher em situação de violência de gênero

Os novos paradigmas jurídicos para enfrentamento da violência de gênero e a análise do contexto cultural que permeia as múltiplas formas de agressão contra a mulher foram alguns temas que guiaram o curso para a advocacia promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, entre os dias 07 a 09 de maio, para assistência jurídica da mulher em casos de violência de gênero.

Até esta quinta-feira, 09, ampliando a compreensão sobre conflitos e fomentando uma análise crítica sobre o reflexo das concepções de gênero, a qualificação teve o propósito de capacitar a classe para a defesa dos interesses jurídicos da mulher em situação de violência doméstica.

Ao realizar a abertura da qualificação, a vice-presidente da OAB/SE, Ana Lúcia Aguiar, abalizou a iniciativa como precípua para o enfrentamento das agressões que se manifestam diariamente contra a mulher. “A violência se acentua cada vez mais no nosso país”, disse.
“Estamos enfrentando um momento que requer muita reflexão e luta. É preciso que as mulheres, vítimas do machismo, da agressão e do patriarcado, consigam levar às barras da justiça os seus algozes. O papel da advocacia nesse contexto é imprescindível”, completou.

Discussões preliminares sobre a violência

A integrante da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da OAB/SE, Gilda Diniz, explanou sobre a teoria feminista, abordando o patriarcado – sob os conceitos da autora e militante Heleieth Saffioti – e o conceito de gênero – sob a ótica da escritora Joan Scott.

Segundo a palestrante, a autora Saffioti afirma que o patriarcado refere-se a milênios da história nos quais se implantou uma hierarquia entre homens e mulheres, com primazia masculina.

“Em suas obras, Heleieth discute o patriarcado e a maneira como a relação entre homem e mulher trata o gênero feminino de forma subjugada. Existe hierarquização e na sociedade contemporânea o patriarcado ainda perdura, apesar de um pouco mascarado”, esclareceu.

Sobre a concepção de gênero, Gilda Diniz falou ainda sobre o conceito da escritora Joan Scott: o gênero enquanto categoria de análise. De acordo com ela, Scott desconstrói vícios do pensamento ocidental, como a oposição tida como universal entre homem e mulher.

Segundo a autora, o gênero é uma percepção sobre as diferenças sexuais, hierarquizando-as dentro de uma forma dual de raciocinar. A palestrante explicou que Scott faz uma análise sobre as maneiras como são construídos significados culturais para essas diferenças.

A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da OAB/SE, Adélia Moreira Pessoa, falou sobre as transformações da sociedade e os novos paradigmas jurídicos no enfrentamento à violência de gênero, apresentando-a como um problema social e político.

Adélia ponderou que a agressão se manifesta de diversas formas, exemplificando-as através do conceito definido na Convenção de Belém do Pará (1994), que estabelece como violência contra a mulher “qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado”.

A palestrante analisou o direito à luz de novos paradigmas, abordando a necessidade de interdisciplinaridade (o diálogo com outros saberes) e da prevalência da pessoa e não dos institutos – a finalidade promocional do Direito: o ser humano em suas especificidades.

Apresentou ainda passos para se chegar à Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e defendeu que o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres deve ser efetivado em três eixos: proteção e assistência; prevenção e educação; combate e responsabilização.

Ampliando a compreensão sobre os conflitos

Sob o propósito de sensibilizar a advocacia, a necessidade de saber identificar e compreender as consequências das agressões na saúde física e psíquica da mulher foi defendida pelas palestrantes Sabrina Duarte Cardoso (psicóloga) e Shirley Amanda Leite (assistente social).

Em suas explanações, as ministrantes falaram sobre os aspectos psicossociais relacionados à violência de gênero. Segundo Sabrina, os profissionais precisam atentar-se às características das partes e da relação entre elas. “É vital perceber tudo o que há por trás do fato”, explanou.

“Cada caso é um caso e a história de cada um é importante. Ao ouvir uma vítima, deve-se tentar entender o que precede e o que é posterior à violência. Há mulheres que têm perturbações psíquicas e, se o profissional julgar somente isso, podem ser desacreditadas”.

Shirley Amanda Leite afirmou a necessidade da ação interdisciplinar para o enfrentamento da pandemia. “Não temos só a perspectiva social (como assistente social), mas também a psicológica, a jurídica, entre outras. Somos uma equipe onde todos constroem estratégias”.
“Nossa ação de enfrentamento à violência doméstica é conjunta. É importante atuar com a vítima e com o autor da agressão. Vivemos no antro de uma cultura machista e é preciso ressignificar a violência e trabalhar questões que contribuam para um mundo melhor”, disse.

A Lei Maria da Penha e as medidas de proteção

Foram temas de explanação também as medidas protetivas da Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha. Estas são maneiras de coibir a agressão e proteger a vítima. A Lei entrou em vigor em 2006 e foi uma conquista significativa no combate à violência de gênero.

A vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da OAB, Valdilene Martins, foi a palestrante sobre o assunto. Em sua fala, explicou os tipos de medidas protetivas e as formas de solicitá-las. Em uma abordagem teórica e prática, esclareceu como exigir a efetivação da lei.

“As mais conhecidas são as de afastamento do lar e de distanciamento, mas as medidas são diversas e transitam entre o Direito Penal e o Direito Civil. Podem ser de bloqueio de bens, de pensão alimentícia, etc. É necessário conhecê-las e saber como pedi-las”, considerou.

Segundo Valdilene, por se tratar de medida de urgência, a vítima pode solicitá-la por meio da autoridade policial, ou do Ministério Público, que encaminhará o pedido ao juiz. A lei prevê que o judiciário deverá decidir o pedido (liminar) no prazo de 48 horas após o pedido.

Outras abordagens

Os aspectos do inquérito policial e a Lei Maria da Penha e o novo olhar sobre a violência doméstica também foram abordados na capacitação. Respectivamente, ministraram as palestras sobre os motes a delegada da Polícia Civil do Estado de Sergipe, Ana Carolina Machado Jorge, e a juíza, Rosa Geane Nascimento Santos.