O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Sergipe, Henri Clay Andrade, formalizou, na manhã de hoje, 20, pedido ao presidente da OAB nacional, Cláudio Lamachia, de inclusão na pauta da sessão do Pleno do Conselho Federal, prevista para o próximo dia 27, da matéria atinente ao decreto de intervenção federal na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro, perpetrado pelo presidente Michel Temer na última sexta-feira.
No requerimento, o presidente da OAB/SE expõe preocupações cívicas e inconsistências jurídicas do decreto, apontando, dentre outras, a natureza militar da intervenção e a ausência de fundamentação.
“Desde a promulgação da Constituição Federal, não assistimos no Brasil medida tão drástica de supressão da autonomia de um Estado federado, fato que nos impõe uma posição institucional urgente sobre a constitucionalidade, a conveniência política-administrativa e os riscos à democracia”, ressalta Henri Clay.
Para a diretoria e a bancada no Conselho Federal da OAB/SE a medida de exceção imposta pelo presidente Michel Temer revela-se inconstitucional, porque o decreto é desprovido de fundamentação, cuja exigência é inerente ao Estado Democrático de Direito, ainda mais quando se trata de ato que suspende a autonomia de um ente federativo.
A OAB/SE ainda enfatiza que também a ausência de motivo concreto para a decretação da intervenção afronta o princípio federativo como norma fundamental da organização política do Estado brasileiro.
O requerimento expõe que a intervenção somente deve ocorrer em situações excepcionalíssimas, expressamente previstas e na forma autorizada no texto constitucional, do contrário, estaria aberta a porta para interpretações lenientes que admitiriam intervenções federais diárias em estados nos quais estivesse a ocorrer situação de comprometimentos da ordem pública próprias do cotidiano das sociedades complexas contemporâneas.
Para a OAB/SE o decreto não contextualiza e nem fundamenta adequadamente qual é o quadro fático do qual se conclua pelo “grave comprometimento da ordem pública”.
Em seu pronunciamento público, o Presidente da República Michel Temer expôs genericamente se tratar de um quadro de desordem que seria generalizada, a necessitar do remédio drástico da intervenção para combater o crime organizado.
No requerimento, o presidente da OAB/SE também ressaltou que, conforme dados apresentados pelo Anuário Brasileiro da Segurança Pública, a levar a criminalidade violenta por habitantes, o índice é muito mais elevado em outros estados da Federação do que no Estado do Rio de Janeiro.
A OAB/SE também solicita em seu requerimento que o Conselho Federal analise a possível inconstitucionalidade em relação ao caráter militar da intervenção.
O Decreto nº 9.288, de 16 de fevereiro de 2018, nomeia para o cargo de interventor um militar da ativa (Art. 2º) e estabelece que esse cargo é de natureza militar (parágrafo único do Art. 2º).
No entanto, a OAB/SE lembra que o instituto constitucional da intervenção não é um instituto militar, mas sim civil. E não pode um decreto presidencial alterar a essência constitucional do instituto da intervenção.
“O decreto ao prevê intervenção militarizada, determina o controle das ações de segurança pública pelas forças armadas. Isso desnatura as finalidades constitucionais das forças armadas dispostas no art. 142 da Constituição Federal, colocando em xeque a credibilidade da instituição”, afirma o Presidente da OAB/SE.
O Art. 142 da Constituição Federal, prevê que as Forças Armadas se destinam à defesa da Pátria e à garantia dos poderes constitucionais. O papel constitucional das Forças Armadas é a defesa da soberania nacional, na perspectiva da proteção do território, base essencial sobre a qual se assenta todo o poder do Estado Brasileiro.
O mesmo Art. 142 também prevê que as Forças Armadas se destinam à “garantia da lei e da ordem”. Mas essa previsão normativa é meramente subsidiária, uma vez que a Constituição da República trata da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas (Título V) e, nele, trata em capítulo especial (Capítulo III), da Segurança Pública, como dever do Estado e responsabilidade de todos, “para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio” (Art. 144), por meio dos órgãos que explicita (polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares). A garantia da ordem pública, portanto, não é missão precípua das Forças Armadas, mas sim dos órgãos constitucionais da segurança pública, com atribuições, competências e limites bem delineados nos parágrafos do Art. 144, salienta a OAB/SE em seu requerimento.
A OAB/SE também invocou a Lei Complementar n° 97/1999 – que “dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas” (no que atende ao comando constitucional do § 1° do Art. 142 da Constituição, que remeteu à lei complementar a regulamentação da matéria) – ao estabelecer, em seu Art. 15, § 2°, que “A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.
Outro aspecto do Decreto Presidencial nº 9.288/2018 apontado no documento enviado ao Presidente do Conselho Federal da OAB, reporta à ausência de especificação das condições de execução da intervenção. Isso porque, segundo a OAB/SE, a Constituição Federal exige que decreto de intervenção especifique a amplitude, o prazo e as condições de execução da intervenção, bem como nomeação do interventor, se for o caso (Art. 36, § 1º).
O Decreto Presidencial nº 9.288/2018 delimita a amplitude (setor da segurança pública), estabelece o prazo (até 31/12/2018), nomeia interventor (General de Exército Walter Souza Braga Netto), mas não dispõe sobre as condições de execução da intervenção.
“Dispor sobre isso é estabelecer, ao menos, as diretrizes das ações a ser planejadas e executadas com vistas ao alcance do objetivo. No caso, seria indicar, ainda que genericamente, quais medidas serão adotadas para pôr termo o grave comprometimento da ordem pública no Rio de Janeiro”, enfatiza o presidente da OAB/SE.
Fonte: Jornal do Brasil