O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por meio da Comissão Especial da Criança e Adolescente, vem manifestar-se quanto à publicação do Decreto nº 10.003, de 4 de setembro de 2019, que destitui os conselheiros da sociedade civil e altera procedimentos no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA. As entidades foram eleitas para o mandato relativo ao biênio 2019/2020. Apontamos manifesta preocupação com a violação ao princípio da democracia participativa, ao artigo 227 da Constituição Federal, à Lei nº 8.069/90, à Lei nº 8.242, de 12/10/1991, à Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas (ONU) ratificada pelo país em 1990, e por considerar ainda o seguinte:
1. O CONANDA é o órgão do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente – SGD, criado por lei e instrumento de participação e deliberação das políticas públicas asseguradas para crianças e adolescentes, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Formado paritariamente por membros do governo e da sociedade civil, tem como missão precípua a promoção, a defesa e a garantia integral dos direitos da criança e do adolescente. Os conselheiros da sociedade civil têm função relevante (art. 88, II, e 89 do ECA), com atuação conjunta com os representantes governamentais no conselho e em obediência ao processo eleitoral, que define as diretrizes internas e de procedimento para o seu pleno funcionamento, por meio de resoluções aprovadas em assembleia deliberativa;
2. Ao CONANDA compete elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da crianças e do adolescentes, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.242 de 1991, sendo a forma de deliberação das políticas públicas, no campo da assistência, educação, saúde, lazer, cultura e demais direitos, assegurados pelo artigo 227 da Constituição Federal, pela lei nº 8.069/90 (ECA) e por meio de resoluções, que são normas orientadoras e de procedimentos adotados para a implantação das políticas sob o regime de colaboração com os Conselhos Estaduais e Municipais em todo o território nacional. Esses atos normativos estão disciplinados pelo artigo 59 da Constituição Federal. São relevantes, além das atribuições já definidas por lei, aquelas deliberadas pelo Conselho ao longo de seu funcionamento, destacando-se as últimas alterações previstas na Resolução nº 217 de 2018, do Conanda;
3. Para o pleno funcionamento do Conselho deve ser considerado o impacto de alterações na atual gestão, cujo processo ocorreu de forma legítima e atendendo ao que preconiza a norma já aprovada, sem que possa ser modificada nos termos do Decreto publicado de nº 10.003, de 4/10/2019;
4. O Estatuto da Criança e Adolescente dispõe em seu art.88, inciso II, quanto à importância da articulação conjunta entre órgãos governamentais e não-governamentais sendo, por meio dos conselhos dos direitos, legalmente responsáveis pela deliberação das políticas públicas para o público infanto-juvenil. Além de relevante e não remunerada, a função do conselheiro é considerada de interesse público, devendo atuar no controle social, inclusive de monitoramento dos recursos do Fundo da Infância, responsável pelo custeio das ações, projetos e programas para execução das políticas públicas.
Diante da relevância do Conselho e da função dos conselheiros, legitimamente eleitos e no exercício do mandato vigente, e ainda, por ser o Decreto de caráter restritivo e que estabelece regras de caráter discricionário de lavra exclusiva do Executivo, é que a OAB pugna pela revogação do Decreto nº 10.003, de 4 de setembro de 2019. Ao mesmo tempo, exige que se cumpra a norma constitucional e infraconstitucional, bem como as resoluções do CONANDA, para ser restabelecido o pleno funcionamento do Conselho, com o exercício legal das atividades dos conselheiros relativas a gestão atual e as que forem decorrentes do processo legítimo e de acordo com o princípio da democracia participativa.
Comissão Especial da Criança e Adolescente