A audiência pública realizada nesta segunda-feira, 07, pela Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, e que colocou em debate a regulamentação do uso medicinal da cannabis contou com a explanação de três especialistas no assunto. Entre os temas abordados, a fitoterapia canábica, as aplicações clínicas, os aspectos positivos e negativos sobre o uso medicinal, etc.
Foram palestrantes o médico acupunturista, Pedro Mello, pós-graduado em dor, pesquisador e prescritor da Cannabis, especialista em Neurociências Aplicada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro da Diretoria técnico-científica das Associações Cultive e Acolher; a farmacêutica, Renata Monteiro, pós-graduada em Homeopatia e Cosmetologia, membro da Comissão de Plantas Medicinais e Fitoterapia do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF/SP), farmacêutica da Cultive associação de Cannabis e Saúde, diretora científica do Instituto Jurema e membro da Rede Nacional Feminista e Antiproibicionista (RENFA); e o professor adjunto do Departamento de Biociências da Universidade Federal de Sergipe (UFS), José Ronaldo dos Santos, mestre e doutor em Psicobiologia pela UFRN, pós-doutorando em Neurofarmacologia.
O médico acupunturista, Pedro Mello, destacou em sua palestra os aspectos técnicos-científicos dos canabinóides. Ele explicou como os canabinóides endógenos, fabricados pelo corpo e da planta interagem, falou sobre algumas aplicações clínicas e apresentou alguns artigos científicos e algumas indicações que existem nos guidelines, de como está se prescrevendo e acompanhando. Pedro também polemizou e colocou em debate qual a política de regulamentação que a sociedade quer diante da demanda que existe de pacientes com indicação para fazer uso da cannabis de forma medicinal.
De acordo com o médico Pedro Melo, o País tem hoje um cenário onde existe um grupo como o do Governo Federal, juntamente com o Ministério da saúde e da Cidadania que preconiza que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve importar o canabidiol (CBD) para poder garantir o atendimento aos pacientes pelo SUS. “A gente acha isso surreal tendo em vista que outros medicamentos mis simples e baratos não consegue chegar à mão de quem tem necessidade”, diz.
Indicações
Segundo ele, existe também o grupo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que que encerrou a consulta publica 654/655 relacionadas à Cannabis Medicinal, que debateu com a sociedade, onde preconiza o plantio dentro do território brasileiro, mas dentro de um formato que prioriza a grande indústria na área canábica.
“E o terceiro grupo somos nós, a sociedade civil organizada por meio das organizações das associações que quer ter direito ao autocultivo, ao cultivo associativo em parceria com as universidades e que a produção seja feita no Brasil. O grupo pleiteia ainda que essas medidas de proteção que a Anvisa coloca sejam proporcionais ao tamanho do cultivo e que esses cultivos individuais e associativos tenham apoio técnico para que as pessoas tenham um tratamento otimizado e o dinheiro arrecadado no imposto, com a produção pelo Governo brasileiro seja utilizado para o amparo da política daqueles que hoje vivem e sofrem com o reflexo da guerra às drogas, que são guerras às pessoas”, ressalta.
Conforme Pedro Mello, entre as indicações estão problemas como o transtorno de humor, do tipo ansiedade e depressão, e Alzheimer e Parkinson, como doenças neurodegenerativas, o autismo e epilepsia e o tratamento da dor”, citou.
Fitoterapia canábica
A farmacêutica, Renata Monteiro, falou sobre Fitoterapia Canábica. A abordagem foi relacionada à Cannabis como uma planta. “Tratei do efeito comitiva, falando não só o CBD, assim como o THC e todos os outros compostos que fazem parte desse efeito comitiva que é o que proporciona uma resposta terapêutica melhor do que quando se utiliza o canabiol na forma isolada”, disse.
Segundo Renata, foi mostrado na exposição o aspecto da utilização e como funciona o mecanismo de ação. “Nós temos receptores no nosso organismo inteiro, com maior concentração no cérebro e intestino. Temos, inclusive, os endocanabinóides, que são aqueles produzidos pelo próprio organismo”, ressaltou.
De acordo com a palestrante, muitas doenças ocorrem por causa da desestabilização desse sistema endocanabinóide, por isso que cada pessoa tem uma dose, cada um necessita de um canabinóide diferente porque cada pessoa tem uma deficiência no sistema endocanabinóide. “A gente faz uma reposição do sistema endocanabinóide através dos fitocanabinóides, então não é só canabidiol, e por isso que a pessoa necessita de todos os canabinóides mais os terpenos, que são os responsáveis por modular o efeito no organismo, potencializando ainda mais a ação dos canabinóides”, explicou.
Aspectos históricos
Conforme Renata Monteiro, são 1.269 compostos, sendo 144 carabinóides diferentes e todos têm ação terapêutica. “Ele é um potente anti-inflamatório, antibiótico, e pode ser utilizado para a redução de espasmos de epilepsia, para dor, aumenta a imunidade, é antioxidante, é neuroprotetor e promove a neurogênese, por isso é também utilizado para as doenças neurológicas no geral”, revelou.
O professor adjunto do Departamento de Biociências da Universidade Federal de Sergipe (UFS), José Ronaldo dos Santos, falou sobre os aspectos históricos do início do uso da Cannabis. “Esse uso que remonta a China há oito mil anos atrás até os dias atuais, passando pelo período em que não era proibido até o início da proibição que ocorreu por volta da década de 30”, afirmou.
O palestrante também enfatizou as questões científicas, abordando as pesquisas que estão sendo desenvolvidas, mostrando aspectos positivos e negativos sobre o uso medicinal da Cannabis.
“Hoje existe uma gama de trabalhos relacionado a efeitos positivos como o tratamento da doença de Parkinson e também para o tratamento da epilepsia. Já existe, inclusive, autorização e prescrição desses medicamentos a base de compostos de derivados da Cannabis para essas duas doenças aqui no Brasil”, ressaltou.
Quanto aos aspectos negativos, o professor revelou que eles estão relacionados a dependência, vício em geral, desmotivação e em geral estão relacionados ao uso crônico. “Entretanto, esses aspectos negativos são questionáveis. É necessário um maior número de pesquisas para que a gente possa conhecer se esses aspectos negativos eles realmente sobressaem aos positivos, porque se a gente olhar comercialmente existem medicamentos para tratar algumas doenças que a gente conhece que têm um efeito deletério muito maior do que benéfico”, observou.