Nessa quarta-feira, 12, a Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe (OAB/SE), por meio da Comissão de Direito Imobiliário Notarial e Registral, com o apoio da Escola Superior de Advocacia e do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM) realizou a terceira edição do Projeto Encontros Condominiais. O tema em debate desta vez foi “Violência Doméstica nos Condomínios – Análise do Projeto de Lei2.510/2020”. O evento foi transmitido pelo canal da OAB no Youtube, www.youtube.com/oabse.
A abertura do evento foi feita pelo presidente da Comissão de Direito Imobiliário Notarial e Registral, Pedro Ernesto Celestino. O presidente deu as boas-vindas aos participantes e palestrantes e destacou o objetivo do Projeto Encontros Condominiais, que é o de trazer para a advocacia, estudantes e a sociedade em geral o debate sobre temas relevantes ligados a área condominial.
Pedro Celestino destacou ainda o tema do encontro que trouxe uma discussão sobre o Projeto de Lei 2.510/2020, que foi aprovado no Senado, encaminhado à Câmara dos Deputados e está trazendo grandes repercussões, com muitas posições favoráveis e contrárias.
Palestrantes
O evento foi moderado pelo membro da Comissão de Direito Imobiliário Notarial e Registral da OAB/SE, membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB nacional e do IBRADIM, Saulo Álvares, e teve como palestrantes a membro do Instituto de Desenvolvimento e Estudo do Direito Condominial (InDDIC), Andrea Gonçalves; a juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE), membro da Diretoria AMB Mulheres para a Região Nordeste, membro do Grupo de Trabalho “Covid-19 e Violência Doméstica”, criado pela Portaria CNJ nº 70, de 22/04/2020, Eunice Prado; e da advogada, palestrante e pesquisadora sobre Direito Condominial do Rio Grande do Norte, Williane Guimarães.
A juíza Eunice Prado disse que na primeira semana em que foi detectada a emergência mundial a AMB Mulheres começou a estudar a situação de violência doméstica. “A gente ficou impressionada com a quantidade absurda de casos. Começamos a investigar o que a justiça dos outros países estava fazendo para combater a violência doméstica. O primeiro dado obtido foi o de que os números caíram, mas isso não significa que a violência deixou de existir, pelo contrário, as mulheres isoladas não conseguiam sair pra notificar ou estavam cem por cento vigiadas pelos agressores. Outro dado foi que o número de feminicídios aumentou. No Acre o aumento foi de 300%”, afirmou.
Segundo ela, ao pesquisar o que poderia ser feito para combater a violência doméstica no período de pandemia, descobriu-se que na índia, as mulheres pediram ajuda silenciosa com um sinal na mão. “Com base na experiência da Índia, o presidente do STF e do CNJ, ministro Dias Toffoli, criou um grupo de trabalho o qual eu integro representando a região Nordeste, e nós bolamos a campanha do sinal vermelho (um X) contra a violência doméstica. É um sinal democrático e acessível para qualquer pessoa”, disse.
Cárcere privado
De acordo com a juíza Eunice Prado, a campanha conta com a participação dos farmacêuticos. “Hoje nós temos 200 mil farmacêuticos cadastrados e 10 mil farmácias em todo o país. As maiores associações de farmácia brasileiras estão aderindo. As farmácias servem como um ponto de primeiro atendimento. A campanha é um sucesso e no primeiro mês já atingiu mais de cinco milhões de pessoas e muitas vítimas foram salvas”, relatou.
Com relação aos condomínios, ela revelou que na pandemia está ocorrendo mais registros de cárcere privado. “É aí que entra a obrigação e o dever dos síndicos e condôminos. Em Pernambuco tem uma lei desde o ano passado que multa o condomínio desde que a ocorrência esteja registrada no livro que fica na portaria. Se tiver o registro, o síndico tem que chamar a polícia”, revelou.
Quanto ao Projeto de Lei que está sendo discutido no Congresso, ela afirmou que vem na esteira de uma serie de alterações legislativas que estão acontecendo em profusão por força da pandemia. “Houve um afã de colocar todos os projetos para andar só que sem a devida discussão”, avaliou.
Sem discussões
A advogada do Rio Grande do Norte, Williane Guimarães, disse que tem muitas críticas a Lei 2.510/2020. “Nós advogados estamos entre a relevância da lei que hoje se transmudou em leis estaduais. “No Rio Grande do Norte tivemos um aumento na pandemia de 260% do número de casos de violência doméstica. São dados bastante alarmantes”, disse.
Segundo ela, a Lei Estadual que trata sobre condomínio foi de extrema relevância para tutelar os casos, mas por outro lado a aprovação da lei foi feita de maneira afobada. “A gente não fez discussões, não trouxe isso para a realidade prática. Pegamos uma situação que é grave e simplesmente transformamos numa lei que recebe inúmeras críticas e que talvez nem vá ter tanta aplicabilidade prática diante das dificuldades”, afirmou.
De acordo com Williane, no Rio Grande do Norte existem dois projetos contra a violência doméstica: Clara Camarão, que é vinculado a Associação Brasileira das Advogadas Criminalistas (ABRACRIM) e Romper o Silêncio, que é de âmbito nacional.
“A Lei Maria da Penha já diz que é dever da sociedade civil denunciar, então o síndico por si só já teria esse dever. O que eu acho que não ficou tão adequado na lei foi o fato de ter sido jogada toda a responsabilidade das denúncias para o síndico, como se o síndico por ser o representante legal do condomínio tivesse essa exclusividade da denúncia. O síndico deve denunciar não só porque tem medo de uma prestação pecuniária, mas sim porque tem o dever civil, moral e porque como ser humano tem que proteger as pessoas”, salienta.
Intromissão na esfera privada
Outra crítica feita por Williane à lei foi com relação à intromissão em uma esfera privada ao ponto da legislação dizer que se o síndico não denunciar será destituído. “Temos ali uma ingerência total dentro do condomínio. Além disso, tem também a questão da multa”, disse.
A integrante do Instituto de Desenvolvimento e Estudo do Direito Condominial (InDDIC), Andrea Gonçalves, disse que o Projeto de Lei realmente trouxe a visão de violência contra a mulher e que através das emendas foi acrescentada a preocupação com a proteção das pessoas idosas, das crianças e das pessoas com deficiência.
De acordo com Andrea, o isolamento social fez com que a violência doméstica ficasse latente e alguma coisa precisava ser feita, mas de forma racional e razoável. “A Lei está trazendo para o gestor do condomínio um múnus que talvez seja da sociedade como um todo. Eu já fui síndica, enfrentei esse problema no condomínio e tentei trazer a conscientização. É preciso que se tenha uma conscientização geral, os condôminos já têm essa condição natural de impor ao gestor essa obrigação de tomar uma providência e com a lei talvez isso vá se respaldar ainda mais, o que me traz um pouco de preocupação porque na verdade essa é uma obrigação de todos e não só do gestor”, enfatiza.
Conforme Andrea, em Sergipe ainda não tem uma lei estadual em relação ao Projeto de Lei. E entre as suas principais preocupações em relação ao Projeto de Lei está à questão da destituição do síndico, bem como a aplicação da multa e a possibilidade de fazer do denunciante uma provável vítima do agressor.