Na quarta-feira, 19, a Ordem dos Advogados do Brasil, através da Comissão de Direito Médico e Saúde, promoveu um debate virtual sobre a ADPF 131 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), que está em tramitação no Supremo Tribunal Federal desde 2008.
Ajuizada pelo Conselho Brasileiro de Óptica e Optometria (CBOO), a ADPF visa a declaração de inconstitucionalidade dos Decretos Presidenciais nº 20.931/1932 (artigos 38, 39 e 41) e nº 24.492/1934 (artigos 13 e 14), que fazem restrições ao exercício profissional de optometristas.
Os decretos estabelecem que os diagnósticos e prescrições oftalmológicos são competências exclusivas a médicos, tornando ilegal pedido de exames, consultas e prescrição de lentes por optometristas – profissionais voltados aos cuidados com o bem-estar dos olhos e da visão.
A CBOO sustenta que os dispositivos não condizem com a Constituição Federal porque os valores sociais do trabalho e a garantia da liberdade de ofício ou profissão estariam sendo ofendidos, uma vez que instituem ser ato privativo do médico o atendimento à saúde visual.
Contudo, em junho deste ano, o STF considerou os decretos constitucionais. A presidente da Comissão de Direito Médico da OAB/SE, Clarissa França, explicou que segundo os dispositivos os optometristas são vedados de receitar medicamentos, ter consultório médico, etc.
“O STF entendeu que as restrições aos optometristas continuam. Porém, afirma que questões podem ser regulamentadas via Poder Legislativo. No debate, dois advogados trarão o lado dos optometristas e um advogado falará da saúde pública, afirmando as distinções entre funções”.
O debate virtual da OAB/SE sobre o assunto contou com as explanações de Eduardo Formiga, membro da Comissão de Sergipe; Alberty Ogliari, membro da Comissão de Direito Médico da OAB/DF; e Fábio Cunha, membro da Comissão de Direito Médico e da Saúde do CFOAB.
Eduardo e Fábio proferiram suas palestras em defesa dos optometristas e Alberty defendeu o posicionamento dos oftalmologistas. O primeiro a ministrar explanação foi Eduardo, que iniciou sua fala distinguindo as funções e os estabelecimentos de atuação dos profissionais.
“O consultório detém sumos médicos, como colírios, agulhas, equipamentos de laser – são materiais que os optometristas não usam. Eles possuem gabinetes optométricos e não substituem médicos oftalmologistas. Optometristas atuam em olhos saudáveis e não doentes”.
Eduardo explicou que os optometristas atuam na atenção primária da visão. “Eles buscam resgatar as funcionalidades da visão e não curar doenças. Por exemplo, pessoas que precisam apenas substituir os óculos procuram optometristas – é assim que funciona em outros países”.
Em seguida, Fábio Cunha aprofundou o debate através de uma análise da decisão do STF. “O voto de Gilmar Mendes tem fortes contrariedades. Apesar de que o Supremo reconheceu de forma clara e expressa a qualificação da optometria, muito confundida com a do oftalmo”.
“Dizem que o optometrista não tem qualificação sob o discurso de: ‘você estará prejudicando sua visão porque perdeu a oportunidade de ir ao médico, pois só ele tem a capacidade de cuidar da saúde de seus olhos’. Esse sofisma existe porque a medicina conseguiu um mérito”.
“Essa criminalidade da profissão acaba sendo um discurso até antiético. Todas as decisões que temos Brasil a fora que afastam os optometristas de exercerem suas funções estão baseadas nessas premissas e sofismas de que só o médico possui conhecimento e preparo”, abalizou.
“Os cursos de optometria preparam os profissionais para diferenciar um olho saudável de um olho doente. O optometrista não precisa, por exemplo, saber qual é o tipo de glaucoma. Ele só precisa ver o sinal de alguma alteração patológica para encaminhar o cidadão a um médico”.
Alberty Ogliari encerrou o ciclo de explanações com uma abordagem cronológica das decisões, explicando as premissas dos decretos. Alberty pontuou que a impossibilidade de prescrever lentes e vender os insumos é uma vedação para não haver conflito de interesses.
“Não se trata de uma questão médica entre oftalmologistas e optometristas. Trata-se somente da refutação da lei, que várias autoridades entendem que é constitucional”, considerou. O ministrante citou ainda alguns pontos do voto do relator na matéria julgada pelo STF.
“O intuito é não privar a população de um correto diagnóstico”, pontua. “Em seu voto, Gilmar afirma que entende que a restrição não é inconstitucional e liberar a prescrição de lentes para os optometristas poderia causar prejuízos à população. São cursos técnicos e bacharéis”.
Alberty explicou que o voto defende que deve haver uma ponderação entre o direito à saúde e a liberdade profissional. “O ministro quis dizer que colocar o optometrista como cuidado primário da visão seria privar a população de ter um diagnostico adequado”, esclarece.