Efetivando a representatividade e o lugar de fala, a live promovida nesta terça-feira, 28, pela Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, abordou os principais motes atinentes à população intersexo e assexual. Entre eles, o conceito dos termos, os estigmas e os desafios.
Foram ministrantes na live, Walter Mastelaro, assexual e coordenador do Núcleo de Saúde e Diversidade da Comissão de Diversidade e Gênero da OAB/SP; Thaís Beto, intersexo e presidente da Associação Brasileira Intersexo; e Joel Filho, intersexo e advogado da ABRAI.
O evento foi transmitido pelo canal da OAB/SE no Youtube e ocorreu nesta terça-feira, 28, em celebração ao mês da visibilidade intersexo e assexual. As explanações foram mediadas por Mônica Porto, intersexo e presidente da Comissão de Direito LGBTQI+ da OAB/SE.
“São dois assuntos muito importantes que são comemorados esse mês. Eu sou intersexo; acho que todo mundo já deve saber porque é algo que eu sempre falo, mas é importante dizer que ninguém é obrigado a falar. Sair do armário não é contar para as pessoas, mas sim se aceitar”.
O conceito do termo e os desafios permanentes da pessoa intersexo
Thaís Beto deu início às explanações ressalvando a importância da live, pois fomenta o debate de temas invisibilizados. A palestrante explicou o papel da ABRAI, que busca a implementação de políticas públicas que protejam bebês intersexo e presta apoio jurídico à população “i”.
Ela esclareceu ainda o conceito do termo ‘intersexo’. “O bebê que nasce com uma genitália na qual, no momento do parto, o médico não sabe dizer se ele tem uma vagina ou um pênis é considerado intersexo. Mas não é simplesmente isso. Há as variações na genitália”, disse.
“Pode haver uma pessoa com vagina e ausência de útero; com pênis e ausência de testículo; que tem um ovário com características testiculares; etc; e há todo um funcionamento nesse corpo, principalmente na puberdade, de não sabe como essas variações vão agir”, ponderou.
Thaís citou que os desafios de ser intersexo ocorrem durante toda vida. “A pessoa intersexo acaba precisando da justiça por toda vida. Desde a hora que nasce, para o registro de seu nascimento; até toda a vida, para ter direito à medicamento de alto custo; hormonização, etc”.
“O intersexo é uma característica biológica. Em 14 países do mundo, ele já é conhecido como o terceiro sexo. E dentro dessa pauta nós temos duas lutas grandes: pelo direito à certidão de nascimento e pela autonomia física e psíquica dos corpos intersexo”, considerou a palestrante.
Os estigmas da pessoa assexual criados pela sociedade
Walter Mastelaro falou sobre os estigmas criados sobre as pessoas assexuais. “Às vezes, falar de assexual é tão curioso quanto falar de intersexo, pois muitas pessoas não compreendem que se trata de uma identidade sexual, como a heterossexualidade, bissexualidade, etc”.
“A assexualidade não fala sobre sexo; sobre prática sexual; não fala sobre não fazer sexo. Fala sobre não se sentir atraído sexualmente por outra pessoa. Isso quer dizer uma pessoa assexual não sente ou sente muito pouco o desejo de praticar atos sexuais com alguém”, ponderou.
“Esse é um assunto antigo. Em 1600, a exemplo, consideram que havia dois tipos de pessoas: as que sentiam atração sexual por outras; e as que só sentiam atração romântica. As últimas não tinham interesse em fazer sexo com as pessoas pelas quais elas se apaixonavam”, aclarou.
Mastelaro explicou que a ausência de atração sexual acontece ou de maneira baixa ou nunca existe. “Na vida das pessoas que não são assexuais, o desejo de se envolver com práticas sexuais é constante e permanente. Isso não é algo que acontece com pessoas assexuais”.
Ele explicou também sobre o processo de identificação. “Às vezes me perguntam ‘mas e o que eu sou?’ e eu respondo ‘não sei’. Quando falamos de identidade estamos dizendo de algo auto identificável. É sobre o que cada um sente, se identifica e considera ser o mais confortável”.
As mudanças no corpo da pessoa intersexo e a ausência de educação sobre o tema
Em seguida, Joel Filho falou sobre as mudanças no corpo da pessoa intersexo e a ausência de educação sobre o assunto. “Quando eu tinha 15 anos e era atleta de basquete, comecei a sentir que meu corpo estava passando por uma mudança da qual eu desconhecia”, disse.
“Eu dizia à minha mãe que havia algo de errado comigo porque eu sentia que meu rendimento no esporte estava ficando mais lento que de outros rapazes. Mas a gente não aprende sobre a intersexualidade na escola. Vemos de forma bem rasa como uma doença genética”, citou.
“Minha mãe sempre me escutava e fomos a todos os hospitais. Todos os médicos falavam a mesma coisa: esse garoto não tem nada. Fui levado a psiquiatras; diziam que eu inventava doença. Infelizmente, os profissionais de medicina não estão preparados para nos atender”.
Joel afirmou que só aos 18 anos um médico solicitou exames hormonais. “Ninguém nunca havia me pedido um teste hormonal masculino, até porque minha leitura da passibilidade cis gênera é de um indivíduo 46xy. Não deu nenhum problema e ele me passou viagra”, contou.
“Decidi me alistar no exército. Já que os médicos diziam que tudo era frescura, pensei que receber ordens, fazer exercícios, etc, vai me fazer um homem de verdade. Foi um recrutamento sacrificante. Meu corpo não respondia ao que era esperado”, afirmou Joel.
“Uma vez um recruta me falou que minha bunda era mais bonita que a da namorada dele. A questão que eu descobri depois é que meu corpo produz hormônio feminino e masculino ao mesmo tempo, mas minha produção de testosterona é muito baixa”, contou o ministrante.