OAB/SE realiza debate sobre os aspectos legais acerca da vaquejada

Nessa quinta-feira, 25, foi realizado na Sala de Aula da Escola Superior de Advocacia (ESA) um acalorado debate sobre a vaquejada. O evento promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe (OAB/SE), por meio da Comissão de Promoção Cultural em parceria com a Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais teve como tema “Vaquejada: Manifestação cultural ou violação dos direitos dos animais”.

O presidente Comissão de Promoção Cultural da OAB/SE, Adão de Souza Alencar Neto, revelou que inicialmente o evento foi pensado como uma forma de homenagear o vaqueiro, cujo dia foi comemorado em 21 de julho. Só que depois a Comissão resolveu realizar o debate tendo a vaquejada como temática por se tratar de um assunto muito polêmico e que gera muitas discussões, inclusive jurídicas.

Segundo ele, o tema não ficou resolvido só por causa do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2016, quando a Corte considerou a prática da vaquejada inconstitucional. Adão citou a Proposta de Emenda a Constituição (PEC 304/17) também conhecida como a PEC da Vaquejada, agora Emenda Constitucional 96, que considerou possíveis as práticas esportivas com animais desde que fossem reconhecidas como manifestação cultural, patrimônio cultural e imaterial, e como a vaquejada estava nesse rol a PEC considerou à prática da vaquejada não cruel.

“Além disso, para nossa surpresa agora no início de julho, a Câmara Federal votou texto-base de um projeto de lei (PL 8240/17) que regulamenta as práticas da vaquejada em âmbito nacional. A proposta é consequência da Emenda Constitucional 96, que, entre outros pontos, reconhece a vaquejada como um bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro. A emenda determinou ainda a regulamentação da prática por uma lei específica, que assegure o bem-estar dos animais envolvidos”, pontuou.

A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais, Danielle dos Santos Ferreira, ressaltou a importância do debate na medida em que representa o confronto de diferentes ideias. “É um tema necessário porque no início de julho o texto-base da lei que regulamenta a PEC foi aprovado e alguns destaques ainda vão ser discutidos na Câmara Federal. A gente entende que este debate é uma oportunidade para ser bem aproveitada. “Que os questionamentos possam surgir, eu mesma tenho alguns inclusive para fazer, e é importante que a OAB cumpra esse papel de Casa da Cidadania, que o espaço seja aberto para o debate de ideias”, disse.

Debatedores

O evento contou com a participação de três debatedores: o vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais, Emanuel Matias da Silva, o advogado e competidor de vaquejada, Brenno Messias, e a veterinária Jhully Carvalho Sobral.

“A ideia é que a OAB como casa democrática trouxesse para esse debate os mais diversos pontos de vista. Como é um assunto muito polêmico a gente acha que tem que ampliar o debate e não se fechar em posições, pelo menos por enquanto”, afirmou Adão Alencar.

O vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais, Emanuel Matias da Silva, falou na sua exposição sobre a existência de duas teorias que são seguidas para a defesa e proteção dos animais, uma delas é do bem-estar animal, onde se entende que o animal serve para a alimentação e para algumas atividades desde que não haja sofrimento a ele. “E outra teoria que particularmente eu sigo, que é a abolicionista, diz que os animais não devem ser usados para nenhuma outra finalidade porque eles não são meio para nada, eles têm fins neles mesmos, devem existir e serem respeitados”, revelou.

Sobre a vaquejada, especificamente, Emanuel afirmou que entende se tratar de uma manifestação cultural. Mas, por outro lado, se referiu as lesões físicas que os animais podem sofrer, como puxar o boi pelo rabo. “Mesmo que haja o protetor, o rabo é a extensão da coluna vertebral, local onde possui a maior quantidade de terminações nervosas do animal, e o tranco além de poder causar lesão gera muita dor. A queda também pode ocasionar diversas lesões para o animal. Por tudo isso, o boi só corre daquela maneira porque está acuado, ansioso e com muito medo. A cultura ela é variável, muda, ao passo que as nossas atitudes e os nossos hábitos mudam, e chegou o momento da gente entender que esse sofrimento psicológico é desnecessário”, pontuou.

Coexistência

O debatedor Brenno Messias destacou que quando se fala numa questão como essa da vaquejada não existe um predomínio de um direito. O próprio Supremo Tribunal Federal tratou na ADI 4983, a situação como uma colisão de princípios: Princípio de Proteção a Fauna e o Princípio de Proteção a Cultura.

“Na verdade o que eu defendo não é que um deva prevalecer sobre o outro, mas que se possa encontrar uma forma de coexistir, como de fato já está tendo. Isso foi que levou a Constituição a ser alterada através da PEC da Vaquejada, com a inclusão do parágrafo 7º, no Art. 225, que protege a prática desse esporte, não só a vaquejada como outras modalidades que envolvem a utilização de equinos e outros tipos de animais desde que elas tenham uma raiz cultural e que se encontrem maneiras de se preservar a integridade física dos animais”, disse.

A veterinária Jhully Sobral falou sobre a parte técnica da vaquejada. Segundo ela, todos os equipamentos que são utilizados com os animais, desde o gado aos cavalos devem ser fiscalizados. Também são vistoriadas as instalações para verificar se estão sendo obedecidas as regras do regulamento da vaquejada. “Verificamos a altura de cama de areia, curral coberto, o estacionamento para colocar os animais, toda essa parte a gente fiscaliza”, diz.

A veterinária disse ainda que a única forma de não haver maus-tratos aos animais é controlando o humano e por isso a fiscalização é feita. “Eu fiscalizo aquele vaqueiro que vai estar montando, que não pode usar de violência contra o cavalo, não pode usar agressividade, não pode tocar o boi, não pode ferir o cavalo de forma alguma. Também fiscalizo quem trabalha no curral, para que não maneje o boi de uma forma que venha a machuca-lo, o motorista do caminhão, enfim toda essa equipe”, diz.

De acordo com Jhully Sobral, no caso da existência de maus-tratos o vaqueiro é desclassificado ou da prova ou do circuito todo, podendo vir a responder criminalmente. “O que antes acontecia e que hoje na vaquejada legal não ocorre mais é que o pessoal furava muito os cavalos com as esporas causando sangramento, e agrediam o boi. Atualmente a gente não permite mais que isso aconteça. É tanto que existe o rabo artificial, o boi não é tocado, parte nenhuma do corpo dele”, afirma.