Por Fabiana Macedo, coordenadora especial para Desenvolvimento da Equidade de Gênero da ESA/SE, e Laila Leandro, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher
A história do Banco Vermelho começou na Itália, em 2016, como um símbolo de enfrentamento à violência contra a mulher e ao feminicídio. A iniciativa nasceu da dor de duas mulheres que perderam amigas vítimas de assassinato e decidiram transformar o luto em um movimento de mobilização social. A cor vermelha, escolhida para os bancos instalados em espaços públicos, simboliza o sangue derramado pelas vítimas e funciona como um alerta permanente sobre a gravidade da violência de gênero.
Inspirada por esse gesto, a campanha chegou ao Brasil por meio das brasileiras Andrea Rodrigues e Paula Limongi, que também haviam perdido amigas em crimes de feminicídio. Desde então, a ideia se espalhou por diferentes cidades, até que, em 31 de julho de 2024, foi oficialmente instituída no país pela Lei Federal nº 14.942/2024. A norma determina a instalação de bancos vermelhos em espaços públicos, consolidando o movimento como parte da política nacional de combate à violência contra a mulher.
Os bancos vermelhos não são apenas monumentos simbólicos. Eles cumprem um papel educativo e social, lembrando que a violência contra a mulher não é um problema restrito ao âmbito privado, mas uma questão estrutural que exige engajamento coletivo. Frequentemente, os assentos trazem mensagens sobre os tipos de violência previstos na Lei Maria da Penha, além de informações sobre canais de denúncia, como o Ligue 180. A proposta é que, ao sentar-se no banco, o cidadão reflita sobre a realidade da violência de gênero e, ao se levantar, se sinta motivado a agir para transformar essa realidade.
Ele homenageia as mulheres que tiveram suas vidas interrompidas pelo feminicídio, encoraja a denúncia da violência e escancara uma verdade incômoda: a igualdade material entre homens e mulheres ainda está distante, e vai muito além das leis ou das políticas públicas.
Ela depende também de nós, sujeitos que operam o sistema de justiça.
Os recentes dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que, no cenário nacional, as violências contra as mulheres estão se intensificando, especialmente nos casos de feminicídio, estupro, violência psicológica e stalking.
Ainda que em Sergipe tenha havido a redução de alguns marcadores, como é o caso do número de feminicídios, não é tempo de brandura na defesa e proteção às mulheres. Ao contrário, o cenário de violência está acontecendo cada vez mais dentro das relações íntimas, ou seja, dentro de um espaço que deveria ser sinônimo de segurança para a mulher.
E esse contexto exige de nós respostas mais conscientes e corajosas. Por isso, o momento simbólico da inauguração do Banco Vermelho na praça pública em frente à sede da OAB Sergipe, nos convida a um movimento: alinhar poder e responsabilidade.
Sim! Porque se por um lado, enquanto operadores do Direito e do sistema de justiça, as nossas ações têm o poder de gerar maior impacto na sociedade, por outro, inevitavelmente recai sob nós uma maior responsabilidade.
Isso traduz-se na necessidade de revermos os nossos discursos públicos, mas também as nossas práticas privadas. Questionar e avaliar o que toleramos em silêncio, o que reproduzimos nos bastidores, o que deixamos passar entre colegas, amigos, familiares.
Que sejamos, então, não apenas operadores do Direito, mas operadores da equidade. Que sejamos vozes, mas também condutas. Que sejamos exemplo, no público e no privado, de um compromisso real com o fortalecimento das mulheres.
E aos homens, uma mensagem especial: que não se excluam desse processo. Ao contrário, que se reconheçam parte dele, não como espectadores ou aliados ocasionais, mas como agentes ativos de transformação. Porque a violência contra as mulheres é também um problema dos homens. E só haverá mudança real quando, entre eles, o silêncio deixar de ser cumplicidade, e a equidade passar a ser, também, uma escolha pessoal e cotidiana.
